Oficina da memória

Maio 2nd, 2009

merendaBenvindos a um espaço onde se forjam as memórias antigas e esquecidas.
Recordar é um acto eminentemente individual mas tem um carácter relacional com a memória enquanto fenómeno eminentemente colectivo, enquanto função de partilha de um passado comum que objectiva a promoção de laços de filiação entre os membros de uma comunidade, com base no seu passado colectivo. A comunidade tende a oficializar uma memória colectiva deliberadamente desenhada para simbolizar a unidade e coesão do seu grupo, garantindo a sua legitimidade e a sustentação do seu consenso social.
Deste modo, entendo que a memória é simultaneamente permanente e mutável. Permanente porque não podemos alterar os factos do passado, mutável porque adequamos os factos passados consoante as necessidades e as ansiedades do presente, o que leva a concluir, que cada presente constrói a sua história. Deste modo, a memória torna-se instrumental e influenciada por objectivos do presente, tendentes a revestir o passado com versões a serem utilizadas e assumidas pelos poderes instituídos, que instrumentalizam a memória através dos meios de comunicação, do sistema de ensino, dos monumentos, dos museus, das bibliotecas e de celebrações-comemorações ritualizadas.
Entre o que se recorda e o que se esquece, entre o que se narra e o que se inconfessa, existirão sempre memórias marginalizadas, dependentes das conjunturas e das circunstancias com que emergem certas recordações, bem como a ênfase com que se evocam certos contornos e pormenores. Entre a permanente interacção entre o vivido e o aprendido, o vivido e o transmitido, nas histórias individuais e colectivas, existirão sempre zonas de sombra, silêncios e memórias dissidentes. O silêncio, por vezes longo, de certas memórias e recordações, não conduz ao esquecimento, mas resiste, apesar da doutrinação ideológica e conjuntural que as confina ao exílio da vontade de recordar. Isto é, o esquecimento definitivo e o inconsciente recalcado e reprimido não são estanques mas permanecem em permanente movimento, transmitindo-se oralmente e e de geração em geração, permanecendo latentes e vivos, negociando as recordações com o tempo, que as enquadrará social e politicamente em tempo oportuno.
Compete-nos a nós, utilizar a memória colectiva, como um corredor onde desenvolvemos uma viagem permanente, migrando constantemente entre os dois pólos do mesmo, o passado e o presente, como justo equilíbrio de referência, identificação e coerência, com aquilo que somos e onde nos forjamos continuamente.

Uma Resposta a “Oficina da memória”

  1. P C (Paulo Camoezas) diz:

    Olá Tó-Zé. Parabéns pelo espaço e pelo conteúdo. São documentos (pensamentos) destes que importa divulgar e preservar para haver um futuro mais límpido aquando das avaliações do passado. E não só circunstancial, também ideias e opiniões serão concerteza bastante uteis e construtivas. Efectivamente a nossa memória é um bem incomparável. Que nos deixa alegres, tristes, desconfiados, optimistas. Tantas são as memórias que todos temos. As memórias podem-nos transportar ao passado, mas principalmente são muito importantes para termos um presente mais rico.
    Neste contexto e como amo Figueiró, aliás tu sabes o quanto amo Figueiró, (é incrivel que ao fim destes anos todos fora ainda sinto que estou aqui, no Porto, de passagem, e que um dia regressarei á minha terra para passar uma reforma tranquila a criar patos e a plantar batatas para dar aos amigos) e esse amor vem precisamente das memórias que tenho e vais-me perdoar mas vou falar de uma que vive constantemente comigo. A minha infancia foi passada toda em Figueiró, muitos amigos, muita brincadeira, fui aluno do professor Vergilio (muito estudo que ele pode estar a ouvir) e principalmente MUITO AR LIVRE, MUITO CAMPO, MUITO PINHAL. Para nós que morávamos no Barreiro a vila ficava a léguas. Brincar para a vila? Isso não era para mim, pelo menos até aos meus 12 / 13 anos. Então passei os meus lindos anos da primária e do ciclo a brincar no Pinhal atrás de minha casa.
    Não era bem brincar, era Explorar. Para quem não sabe existia uma rua em terra onde hoje é a Escola secundária, que dava até á capela, e havia uns caminhitos até a Senhora dos Remédios, e para o lado esquerdo havia mais uns caminhos pelo meio dos pinheiros que davam até ao Bairro. E o que mais recordo com tantas saudades á o cheiro, a luz, a liberdade desses espaços. Lembro-me ao pormenor de todas as esquinas, das árvores mais marcantes, dos trilhos, das pedras. Era um Figueiró muito rural o dessa altura. Hoje existem escolas grandes, bibliotecas grandes, avenidas, até temos um helicóptero. Estamos mais evoluídos, com menos doenças, com mais educação. Mas nada é comparável á voz da tua mãe a chamar-te ao fim do dia para tu ires para casa que já são horas.
    É muito dificil transmitir por palavras as memórias desse tempo nesse espaço particular. Brincar com toda a liberdade em liberdade nos Pinhais atrás de minha casa.

Deixe o seu comentário